Re-visão de mundo 08: da maravilha descobrir e da arte de encobrir o descoberto

Inocência-pés-descalços
perde os Tênis e o cadarço


Treze verões de seca sob os pés descalços e a infância sofrida da Paraíba se pau-de-ararou para o Rio de Janeiro, para morar perto de uma tia distante. Oh! terra de frescas oportunidades, terra acolhedora - e corruptora - da inocência - e longe, bem longe dos olhos de casa...
Lá, nem banheiro tinha; andava descalça cavando seus buracos para as necessidades da vida. Mas o Rio - ah! o Rio... - Rio de Janeiro, junho e dezembro; no Rio não se conta secas, contam-se férias.
Contam-se férias... e faz-se festa nos Shopping Centers da Vida! Para quem nunca vira um tênis de perto (faço lembrar a primaveril inocência da pequena paraibinha), digo que pegou o jeito bem depressa. Experimentou vários - Tênis, repito - de modelos diversos, toda sorte de cores e tamanhos.
Quando a tia distante tomou conhecimento da liquidação que a pequena paraibinha fizera, já era tarde para lhe dizer que não se deve trocar de Tênis como quem troca de roupa. O jeito foi desfazer a viagem e pau-de-ararar a menina de volta para a distância - uma boa distância - do Rio de Janeiro.
E assim acabou-se a viagem da pequena paraibinha, que volta para sua terra, sem banheiro, sem Rio, sem Shopping Center... e agora marcada pelas perdas da vida, coitada, volta sem Tênis - e sem cadarço também...




Um conto de Marcelo Aceti

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